Este post não interessa a ninguém. Os blogs também servem para isso, penso eu. Para a gente deitar cá para fora alguns dos pensamentos que nos ocorrem mesmo que não seja para ninguém ler...
A vida (dos outros) não me passa ao lado e não é intenção minha salvar o mundo ou todas as suas almas. E que raio de feitio tenho eu que rio com muita facilidade (até de mim mesma) e choro ainda mais facilmente.
É que há coisas que por mais que eu tente não consigo levá-las de ânimo leve.
Sinto os filhos dos meus amigos e os meus alunos como um bocadinho meus filhos. O L. bem me diz: "desliga, 'fatias' (é como ele me chama, vá-se lá saber porquê), que só tens dois filhos e estão em casa, se enches o coração com tantos outros nós não vamos caber"... mas não é verdade, eu tenho um espacinho para todos.
Este ano, na escola, tenho as turmas todas de 7º ano e mais uma do 8º. São 8 turmas e passam por mim, por semana, cerca de 180 miúdos. Muitos, dizem vocês. Poucos, direi eu. É que 4 dessas 8 turmas só têm 20 alunos o que quer dizer que são turmas reduzidas porque no meio delas há algum aluno (ou vários) com 'necessidades educativas especiais'.
O Miguel é um deles. A mãe teve uma paragem cardíaca num parto muito demorado, precisou de reanimação e o Miguel não nasceu exactamente igual à maioria das crianças. Passa facilmente por uma criança normal mas tem algumas dificuldades ao nível da motricidade fina e até ao nível cognitivo. Nada que o tivesse impedido de chegar até ao 8º ano. Não se tratam de grandes deficiências.
O nosso país não sabe o que fazer a estas crianças. Ou têm deficiências profundas e podem ser inseridos nas CERCIS, ou têm 'apenas' algumas dificuldades e têm de ser inseridos em 'turmas normais' onde nem os colegas nem os professores têm capacidade/formação para lidar com eles.
Recorrem-se a objectivos mínimos, a avaliações diferenciadas a testes adaptados e a mais malabarismos como se isso fosse o que eles precisassem. Eles precisam é de uma atenção diferenciada o que, no meio de mais 19 e com extensos programas para cumprir, nem sempre é possível dar-lhes.
Na 3ª feira passada eu estava com pouca paciência, confesso. Chateei-me com o Miguel, consciente que a culpa não era totalmente dele pois sei que os outros gostam de o 'picar'.
Foi coisa leve, devo tê-lo mandado calar umas 3 vezes. Ficou por ali e eu nem me lembraria mais do assunto.
Ontem o Miguel veio entregar-me uma carta.
Pedia-me desculpa por se ter portado mal na última aula (sem referir que eram os colegas que se metiam com ele), prometia-me que ia tentar portar-se melhor e que ia fazer um esforço. Sempre se sentira desmotivado nas aulas de Educação Visual porque tinha tido sempre negativa desde o 2º ciclo e que eu era a única que lhe tida dado atenção nesse sentido, no sentido de puxar um pouco por ele, de o motivar com actividades mais aproximadas das suas capacidades mas 'sem serem muito diferentes das dos colegas'.
O que estas crianças mais querem é sentir-se iguais aos outros.
Se teve ajuda ou não para escrever a carta não interessa. Já é louvável ele ter conseguido explicar aos pais a situação e ter tido consciência dela.
Eu sei que o Miguel é muito apoiado em casa, os pais trabalham com ele as suas dificuldades mas, às tantas, estas crianças tornam-se cansativas pela atenção que requerem. Isto é duro de dizer, eu sei.
Por vezes penso no que faria eu se algum dos meus filhos tivesse este tipo de dificuldades ou pior...
Ficaria em casa e dedicar-lhe-ia o meu tempo? Também me cansaria?
A única coisa que posso e que VOU fazer é dar mais atenção aos Miguéis que passam por mim. Consciente que são desgastantes e que nem todos têm o apoio e a atenção que o Miguel tem em casa.
Já para nem falar doutros, que sofrem maus tratos ou que passam fome.
E eles cabem todos no meu coração, sim... Não roubam o espaço dos meus filhos e eu não pretendo criar a tal 'imunidade a estas situações' que é suposto ter já que não posso resolver os problemas do mundo.
PS Um dia destes, vou achar este post muito lamechas e mando-o à vida...