O T. anda no 7º ano. Tem 12 anos. Acabado o 2º ciclo viu-se forçado a mudar de escola para um ambiente que não conhece, onde não conhece ninguém e ninguém o conhece a ele. O T. faz questão que assim continue a ser. Anda vestido de preto, correntes penduradas por todo o lado, cabelos louros mais compridos que os meus...
O seu passado é de violência. O T. foi espancado por um pai drogado e alcoólico. Viu a mãe ser repetidamente espancada (e inclusivamente violentada pelo marido enquanto grávida). Vive agora apenas com a mãe e a com a avó.
O T. odeia a escola. Como a maioria dos adolescente, não consegue perpectivar a longo prazo e não encontra sentido em nada daquilo. A sua motivação intrinseca é zero. A sua postura nas aulas (nas que se lembra de aparecer) é de alheamento total (isto quando não se lembra de fazer asneiras até que o ponham fora da sala).
Esta semana alguém (tanto ou ainda mais fresco que ele) apostou que ele não conseguiria dar um soco a ninguém que fosse mais alto e mais velho. O T. nem pensou duas vezes, daquele assunto percebe ele! Entrou na escola e o primeiro aluno mais velho que encontrou (calhou ser um do 10º ano) levou logo ali um soco na cara.
Bonito! Cara desfeita. Queixas apresentadas. Encarregados de Educação na escola. Suspensão para o T.
Eu pergunto: Quando voltar o que se seguirá? E que respostas damos nós a estas crianças?
É que o T. "só" precisa de mais atenção (possivelmente isso, a esta distância, já não chega mas seria um princípio).
Mas não. Não pode ser.
Um Psicólogo na escola para apoiar uma série de crianças na mesma situação que o T. custa dinheiro e o ministério prefere ‘fazer bonito’ a comprar quadros electrónicos (aos quais, depois, os miúdos não ligam nenhuma) do que investir no desenvolvimento pleno harmonioso das capacidades das crianças. Então não era esse o objectivo do Ensino?
Parece que não. Não pode ser...
Turmas reduzidas de modo a cada professor poder dar uma atenção mais individualizada a estas crianças também custa dinheiro. Menos alunos significaria mais turmas e mais turmas significaria ter de dar emprego a mais professores. Mais professores igual a mais custos.
Não pode ser...
O T. continuará integrado numa turma de 28 em que o professor com mais outras 5, 6, 7 ou 8 turmas mal se lembrará do nome dele quanto mais do backgroud de cada um
Apoio individual?
Não pode ser...
Professores com horas para dar apoios custam dinheiro e o Ministério resolveu reclassificar todas as crianças já diagnosticadas como portadoras de Necessidades Educativas Especiais (e dotá-las espontâneamente de qualidades e capacidades que elas não possuem de todo). Agora, apenas os alunos com deficiências profundas, beneficiam deste apoio. Sim, leram bem. É mesmo só de trissomias para cima. Autismos, síndromas de asperger, mutismos, afasias, discalculias, dislexias isso não conta nada! Estão todos integrados em turmas “normais” de 25-28 alunos. Amanhem-se! alunos e professores sem formação para lidar com estes casos específicos.
Expliquem-me lá como é que nós, Escola e Professores, podemos ajudar as crianças como o T. a integrarem-se, a perspectivar um futuro melhor que o seu passado (e até a ultrapassá-lo), a motivarem-se para aprender e até a sorrirem quando o Estado não quer saber delas para nada?
Ah, esperem, lembrei-me agora! Como família carênciada o T. tem direito a uma consulta de 30 minutos, uma vez por mês (ou será trimestral?), nos Serviços de Pedopsiquiatria do Hospital! Isso faz toda a diferença!!!
Digam-me, se faz favor! As crianças são o futuro do nosso país ou só algumas é que o podem ser?! E o que fazemos às outras? Exterminam-se para não darem problemas?
Estamos à espera de quê?! Que o T. e os outros como ele cresçam ainda mais e façam umas asneiras bem grandes para ‘espetarmos’ com eles numa qualquer instituição e assim deixarmos de os ver e esquecermo-nos que estes problemas existem?
Oh, Senhores mas ISSO PODE SER? Então isso NÃO CUSTA DINHEIRO?!
Desculpem-me. Hoje acordei irritada.
Editado para acrescentar: Com esta conversa anterior eu não quero dizer que acho a atitude ou o comportamento do T. desculpável. Eu só compreendo é o contexto e até me admiro como é que não aconteceu nada pior e mais cedo...